Via do Faisqueira – Pouso Alegre/MG

Em meio a um cenário recheado de fake news e ataques frequentes em relação a posicionamentos políticos divergentes, vimos respeitosamente divulgar o posicionamento técnico do Instituto Fernando Bonillo sobre a Via do Faisqueira.

O Instituto Fernando Bonillo é uma instituição séria, apartidária, com profissionais íntegros e que carrega em seu nome o legado do saudoso Fernando Bonillo, que sempre lutou pela conservação ambiental. Portanto, não nos posicionamos como oposição a qualquer governo. Nossa bandeira é o desenvolvimento de uma sociedade em equilíbrio com a proteção do meio ambiente. 

Esses sempre foram os ideais do profissional Fernando Bonillo, pregados em vida, e este Instituto que leva seu nome tem a missão de os manter aceso.

Compreendido isso, em 2019, após estudos pela equipe técnica do Instituto Fernando Bonillo, entre engenheiros ambientais e biólogos, desde o início fizemos apontamentos sobre diversas irregularidades ambientais constatadas quanto ao projeto da Nova Avenida do Faisqueira.

Frente ao posicionamento de ignorar as tentativas de contato, acionamos o Ministério Público Estadual para que averiguasse quanto à Nova Avenida do Faisqueira, diversas irregularidades ambientais constadas, e que recentemente foram confirmadas pelo próprio Ministério Público Estadual.

Sabemos da importância estratégica de tal via de acesso, e de como ela irá melhorar a mobilidade da região do Faisqueira, porém é possível estes empreendimentos estarem compatíveis com a conservação ambiental ou a mitigação dos danos ambientais, compatibilidade essa que não foi preconizada no referido empreendimento. 

Diante deste cenário, importante trazer à luz questões atuais do impacto socioambiental e econômico desse empreendimento.

A Nova Avenida do Faisqueira, quando sempre desenhada nos projetos técnicos anteriores, sempre teria por função prioritária o controle de enchentes, funcionando além de pista de rolamento para veículos, também como dique de contenção das cheias. Porém, o projeto inicial feito em 2010 por uma equipe técnica da Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI, com a participação efetiva da população e do saudoso Fernando Bonillo foi drasticamente alterado, o que se executado tal projeto, causaria danos ambientais irreversíveis para a várzea do Rio Sapucaí Mirim; que foi o que se fez com as obras que estão em curso. Além disso, tal obra, sem considerar a estrutura do dique para contenção de enchentes, pode correr o risco de ficar submersa nos períodos de cheia do rio Sapucaí Mirim, potencializando ainda mais o cenário caótico desta região que sofre constantemente com alagamentos próximos às margens deste importante corpo hídrico.

Para entender melhor tal assunto, criamos uma linha do tempo aqui:

– 2009/2010: Elaboração do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA para Implantação do Sistema Integrado de Contenção de Enchentes Contemplando os Diques 1, 2, 3, 4 e 5, realizado pela Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI, para obtenção das licenças ambientais dos empreendimentos (clique no link a seguir para consultar o EIA/RIMA 2010).

Este Estudo Ambiental posiciona a Avenida como dique de contenção de enchestes e tem traçado diferente do hoje em execução na região.

– Nov/2018: Prefeitura de Pouso Alegre protocolou na Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – SEMAD, o Formulário de Orientação Básica do empreendimento em questão, que listou uma série de recomendações técnicas para o caso (clique no link a seguir para consulta ao FOB 2018). Não foi dado andamento no processo de regularização ambiental, onde o mesmo foi realizado pela prefeitura municipal, indevidamente.

– Nov/2019: Instituto Fernando Bonillo – IFB protocola junto ao Ministério Público de Minas Gerais – MPMG uma notícia de fato apontando diversas irregularidades relativas a obra em questão, dado a rapidez na execução das ações e ausência de licenciamento ambiental (clique no link a seguir para ver a Notícia de fato 2019). Foram levantadas as seguintes questões:

  • Supressão de vegetação nativa (Mata Atlântica) de mais de 3 hectares, sem anuência do IBAMA;
  • Intervenção em Área de Preservação Permanente (APP) sem a devida autorização dos órgãos competentes;
  • Alteração do traçado proposto em 2010, o que aumentou significativamente a supressão de vegetação (aumento em 10 vezes, conforme relatório do IBAMA) e questionamento sobre alternativa técnica locacional que divergiu dos estudos de 2010;
  • Licenciamento ambiental realizado indevidamente pelo munícipio, não passando pelo processo de licenciamento ambiental previsto pelo estado de MG;
  • Recebimento de título de utilidade pública estadual para alegar tais intervenções em caráter de urgência.

Comparação entre traçados de 2010 (laranja) e 2019 (verde) (Fonte: Relatório IBAMA, 2021)

– Jan/2020: Ministério Público Federal – MPF, após recebimento de comunicação do IBAMA, repassa caso ao MPMG (consulto o material público no link a seguir, pág. 137 do ICP)

Mar/2020: Instauração de Inquérito Civil de Investigação (ICP 0525.19.000885-0) pelo MPMG para apuração das informações e posicionamento sobre o tema (Consulte o ICP aqui)

Jul/2020: Novo protocolo do Instituto Fernando Bonillo para pedido de informações junto ao Ministério Público sobre o assunto, após aprovação de aditivo de valor para a obra.

Ago/2020: IFB envia e-mail ao IBAMA, Ministério Público Federal, SEMAD, informando novas ações sobre licitação (aprovação de aditivo de valor sem avaliar os aspectos técnicos apontados), andamento das obras e pedindo ações cabíveis sobre o assunto (consulte aqui a Nota técnica aditivo licitação

Mar/2021 – Perícia técnica realizada no local por responsável do Núcleo de Combate aos Crimes Ambientais do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente (Nucrim/Caoma) do MPMG

– Nov/2021 – Apresentação pelo MPMG de relatório técnico sobre supressão de vegetação (consulte aqui o Parecer técnico Prístino supressão vegetação)

– Dez/2021 – Apresentação pelo MPMG de relatório técnico sobre ausência de licenciamento ambiental (veja aqui o Parecer técnico Prístino)

Jan/2022 – Reunião entre promotor, prefeitura e responsáveis técnicos onde foram abordados os pontos em desconformidade com a legislação (confira a Ata da reunião) e o (Parecer técnico – DAC Engenharia p/ prefeitura):

  1. Ausência de licenciamento ambiental em nível estadual para as obras de construção da “Via Faisqueira”;
  2. Alternativa técnico e locacional;
  3. Intervenção em Área de Proteção Permanente-APP do Ribeirão das Mortes, afluente do Rio Sapucaí Mirim, com preterição de Documento Autorizativo para Intervenção Ambiental-DAIA e outorga para o direito de uso de recurso hídrico;
  4. Dano ambiental em BIOMA DE MATA ATLANTICA, tendo sido identificados o corte de 1360 indivíduos arbóreos em APP e 5911 em BIOMA DE MATA ATLÂNTICA.

Jan/2022 – Parecer do MPMG reforçando a necessidade de medidas compensatórias mais rigorosas (veja o Despacho 31/01/2022)

– Mar/2022 – Nota técnica elaborada pela DAC Engenharia à Prefeitura sobre o relato de status do projeto de Bacia de Contenção, Detenção e Acumulação para Macrodrenagem do Ribeirão das Mortes (veja a Nota técnica Projeto Bacia de Contenção)

– Abr/2022 – Reunião para apresentação do esboço da minuta do Termo de Ajustamento de Conduta – TAC (veja aqui a ata da reunião e o esboço do TAC)

Como se vê desses históricos, as denúncias promovidas pelo Instituto Fernando Bonillo foram procedentes, desde quando formuladas. As tentativas de contato com a prefeitura sempre foram ignoradas. O encaminhamento para o Ministério Público foi baseado nos crimes ambientais em andamento e na tentativa de se fazer valer o Princípio do Direito Ambiental da Prevenção e da Precaução, o que não foi o caso.

Mesmo tramitando o Inquérito do Ministério Público, as obras continuaram gerando os danos ambientais comprovados pelos técnicos que auxiliaram o Ministério Público, fora a ausência de adequado licenciamento ambiental.

Infelizmente o tempo não volta e as ações não podem ser desfeitas. Os danos ambientais já aconteceram. Porém a responsabilidade civil e penal em se cumprir o que as leis pregam deve ser bravamente seguidas, de forma a compensar adequadamente os crimes ambientais e reparar parte do impacto gerado, visto que em sua íntegra jamais conseguiremos compensar.

A seguir seguem imagens para facilitar o entendimento dos impactos ambientais e a importância de se acompanhar de perto as compensações previstas para reparar o dano e eventual responsabilização penal.

Intervenção em APP hídrica (Fonte: Relatório IBAMA, 2021)
Área com risco de inundação, reforçando a importância de uma estrutura de dique para o local (Fonte: Relatório IBAMA, 2021)
Fragmentos de vegetação isolados pós supressão (Fonte: Relatório IBAMA, 2021)
Fragmentos de vegetação suprimidos (Fonte: Relatório IBAMA, 2021)

E disso ficam algumas reflexões: 

“Somente quando for cortada a última árvore, poluído o último rio, pescado o último peixe é que o homem vai perceber que não pode comer dinheiro!” (Alanis Obomsawin)

“Deus perdoa sempre, o homem perdoa às vezes e a natureza, nunca!” (Romem Barleta)

A conta está chegando… temos que zelar por nossa Terra!

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