Chacreamento Rural Irregular

Não é de hoje que muitas pessoas do meio urbano invadem as zonas rurais com o sonho de adquirir a sua “roça própria” – o sítio ou a chácara do sossego do fim de semana. A rotina das cidades se torna um meio insustentável, com péssima qualidade de vida, e a aquisição de uma chácara seria o descanso, o desafogo necessário, ou quem sabe a mudança de vez para uma vida mais simples e tranquila: longe da violência e da poluição.

No entanto, vale ressaltar que tal aquisição e a tão sonhada guinada pode gerar sérias “dores de cabeça” caso o pretenso proprietário não se oriente adequadamente conforme determina a legislação fundiária. 

O que se vê atualmente é um acúmulo significativo de processos cíveis nos fóruns devido ao chacreamento irregular. Tudo porque existe uma ânsia em adquirir facilmente terrenos baratos, onde reina um “terreno” pantanoso do desconhecimento, pela parte interessada e por parte de corretores de imóveis e demais agentes do mercado imobiliário, ou ainda por picaretas sedentos por fazerem negócios escusos e se beneficiarem.

Para entender o chacreamento rural a venda de propriedade obedece à legislação federal específica, as Leis: Lei nº 4.540/64, Lei nº 5.868/72 e 6776/79. Segundo o Art. 65 da Lei 4.540/64, o imóvel rural não é divisível ou fracionado em uma área de dimensão inferior à constitutiva do módulo de propriedade rural. A área de dimensão mínima para ser legalizada tem que ter a equivalência de 2,00 ha ou 20.000 m², pois a divisão do solo rural inferior a esta metragem pode importar em crime. Não se lavra, nem registra escritura pública mediante formalização de negócio jurídico de área inferior ao módulo rural. Para o fracionamento de imóvel rural para fins de transmissão observam-se as normas do Sistema de Cadastro Rural criado pela Lei nº 5.868/72.

Não há como prefeituras legalizarem um loteamento rural se não obedecerem corretamente à legislação, embora existam Leis municipais de chacreamento em algumas cidades do Brasil, o que é irregular e inconstitucional. Não compete aos municípios editar Leis sobre ocupação de solos rurais, onde o cartório pode e deverá recusar o registro de documento que apresente chacreamentos de áreas menores de 2,00 ha.

Em suma, há uma má conduta assolando este mercado imobiliário por falsos profissionais que prometem facilidades na aquisição de determinada porção de terra. Terras essas muito comuns em locais paradisíacos, por exemplo, com a promessa de grande retorno financeiro e fazer uma grana rápida, ou seja, passando o terreno para frente! Não é de se estranhar placas em locais turísticos como “Vendo Chácaras.” O novo proprietário agora cerca esta área acreditando que o negócio vai ser bacana, como se fosse “passar o recibo.” Quem vende desta forma desconhece um empreendimento regularizado e as suas implicações jurídicas, isso sem contar nas questões ambientais do loteamento. Infelizmente, o fator meio ambiente não é levado tanto a sério, já que tal empreendimento ou lote pode estar inserido numa APP (Área de Preservação Permanente).

Podemos compreender o quanto pode ser danoso para o meio ambiente as irregularidades desses chacreamentos, levando-se em consideração a proibição de qualquer atividade que resulte em impacto em áreas prioritárias de preservação, entre elas às beiras de rios, matas ciliares e áreas de afloramento superficial (brejos).  É preciso, junto a regularização fundiária, obter uma legalização ambiental, sendo previsto um levantamento de APP e regularização da captação de água.

Sendo assim, seguindo o caminho da irregularidade jurídica, se der problema, quem sofrerá as consequências será o proprietário. Todavia, aquele que vendeu, o dito entendido do assunto, estará desaparecido.

É importante frisar que o chacreamento irregular pode resultar em desvantagens financeiras o qual o proprietário não consegue regularizar, gerando processos judiciais onde o sujeito poderá ainda responder contra a administração pública, sob possível abertura de instauração de inquérito na promotoria ou na justiça, o que de fato, cria elementos para uma futura perda da propriedade. Não conseguindo regularizá-lo fica evidente que os serviços públicos não serão atendidos, como ligação de água e luz.

Se faz necessário, portanto, para quem já esteja pensando numa aposentadoria ou para quem queira um local de sombra e água fresca nos fins de semana, procurar assessorias de empresa ou profissionais qualificados e comprometidos com a legislação e com o trabalho juridicamente correto. O pretendente proprietário ou sujeito terá o seu terreno valorizado, podendo inclusive garantir a herança da família e quem sabe conseguir créditos com os bancos para possíveis investimentos na propriedade.

Quem vende facilidades, é bem verdade, está entregando dificuldades! A princípio, a “roça própria” se torna um sonho, podendo ganhar ares de pesadelo mais adiante.

 

Texto: Fernando Capela – biólogo/ornitólogo e ilustrador

 

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