O Êxodo das Maritacas

Há exatamente 20 anos atrás pouco se via ou ouvia maritaca em cidades do sul de Minas Gerais. Seu ingresso à vida urbana por aqui é recente, sem ao menos dar indícios para as pessoas do real motivo do seu aparecimento. O nome popular “maritaca” é antigo no sul de Minas, diferentemente da sua designação popular na literatura, a qual determina “periquitão-maracanã.” Quando criança, nas andanças pela roça, lembro-me de avistar bandos de 30 à 40 aves voando e vocalizando. Algo na época realmente restrita às zonas rurais. O que ocorreu de fato para que esses animais pudessem invadir tão repentinamente as nossas cidades?

Não se sabe ao certo. No entanto, várias respostas podem ser analisadas quando damos conta dos impactos ambientais ocorridos desde a industrialização e expansão das fronteiras agrícolas. Aliás, um estresse ecológico pode ter sido o grande fator responsável pela migração das maritacas às cidades.

A repulsa por essa ave nas cidades tem sido enorme. É reclamação que não acaba mais! A maritaca possui o hábito de se acomodar nos forros e telhados das casas, gerando problemas como predação de fiação elétrica e responsável pela algazarra nas primeiras horas do dia, perturbando o sono de muita gente. É bem verdade, os forros podem ser vedados e a fiação elétrica protegida. Portanto, o fato é que as pessoas preferem reclamar e não solucionar. Preferem avaliar a situação de forma imediatista e não analisar as verdadeiras consequências desta invasão.

A maritaca ou periquitão-maracanã (Psittacara leucophythalmus) é uma ave da ordem dos Psittaciformes, junto aos papagaios, araras, periquitos e maracanãs. Encontrada em praticamente todo o Brasil, exceto em algumas localidades da região Nordeste, pela sua larga distribuição já nos dá um diagnóstico da problemática – é uma ave bem adaptativa não exigindo ambientes específicos. Como todos os membros da ordem apreciam frutas e sementes. Podem ser predadas por algumas espécies de gaviões, embora a carne desses bichos não seja tão apreciada. Sendo assim, o índice de predação desses animais em zonas urbanas é raro, já que encontramos também poucas espécies de gaviões em cidades. Tal fato favorece a grande incidência de maritacas nas zonas urbanas, pois quase não possui predador natural. A facilidade de acomodação nos forros e a pouca manutenção das casas propiciam a sua residência, além da quantidade expressiva de árvores e quintais em algumas cidades brasileiras, favorecendo-se assim refúgio e oferta de alimentos.

Em ambiente natural, a maritaca faz seus ninhos em ocos de árvores. A destruição da Mata Atlântica tem sido contínua, principalmente na região Sudeste, principal reduto atual da espécie. Um fato que deve ser observado é a pouca importância dada as árvores mortas, locais propícios para a nidificação de psittacídeos. O desmatamento frequente, a falta de alimentação e de estabelecimentos para a nidificação empurra as maritacas para as cidades. Não há outra explicação mais óbvia que explique tamanho êxodo desses animais. O certo é que devemos pensar o quanto temos sido negligentes com a natureza e a invasão das maritacas aos centros urbanos nada mais é que uma resposta imediata em relação aos nossos maus hábitos – de ganância, falta de conhecimento do campo e amor ao planeta.

Texto e fotos: Fernando Capela – biólogo/ornitólogo e ilustrador

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *